ENSAIO
Bioncinha do Brasil
Pela ausência da crítica de arte/moda ou para não cometermos racismo recreativo
Por Bioncinha do Brasil
“Restituição, da condição de besta
A qual me foi atribuída, aqui estou
Como intercessora, com os joelhos ferido”
Ventura Profana
Ao ouvir o termo “crítica de arte” ou “crítica de moda” já sinto uma gastura ou uma apatia disfarçada de raiva. Quando lembro de críticas escritas por “críticos”, logo me remete a algum branco maluco, metido a besta que chegou na hora errada, para dar os pitacos errados, da forma mais ofensiva e violenta possível. Mas na condição de besta a qual me foi atribuída me cobro y venho partilhar essa responsabilidade, para que possamos tramar nossas formas de nos reverenciar. Vejo necessidade em instalar o caos para aqui questionar:
- Quais são as bases construtivas das críticas de arte ou moda? Ou melhor, qual é o valor de criticar novas perspectivas de arte e moda? Qual é a necessidade da crítica?
Perceba que essas perguntas vão de encontro com o ego delirante do mercado editorial, e quando falo de mercado editorial não entro em críveis raciais, mesmo dizendo de um esquema majoritariamente branco.
Em terras indígenas, temos a honra de ver y presenciar a potência de narrativas originárias, diaspóricas y transvestigeneres em constante ascensão. O que deveria nos preencher de gratidão. Mesmo assim, enquanto parte, grão de areia do todo, percebo que ainda há um apego de comunicação com sequelas coloniais. Mesmo assim não temos motivos para culpas, percebo que é ainda uma forma de assumir que vivemos o mito da democracia racial principalmente nos meios de comunicação. Por exemplo, perceba o que foi escrito sobre a artista Dyony Moura:
“A colaboração com a mineira Nuu Shoes não é um dos pontos altos da apresentação: soa um tanto improvisada, apesar do tom divertido.”
“As poucas peças apresentadas deixam um gostinho de “quero mais”.
Essa parte mais sucinta vem para mostrar a carga de significado de um mercado de moda entupido de vontades e explorações. E dessa vez nós fomos o alvo entre nós mesmos, e isso porque trabalhamos, sim, com excelência, sem ajuda dos que mal dizem de nós. Já é possível perceber que a opressão racial e de gênero ainda está entre nós? Principalmente nas formas como nos referimos?
“Dizer que o racismo recreativo é um tipo de política cultural significa reconhecer seu caráter discursivo, implica a necessidade de examinarmos os processos responsáveis pela produção das representações derrogatórias sobre minorias raciais”.
Não posso escrever esse texto sem essa referência. A primeira frase do parágrafo 3.1 Racismo Recreativo nos Meios de Comunicação de Adilson Moreira, um dos livros da série de feminismos plurais coordenada por Djamila Ribeiro. Estava lendo justamente essa parte no dia em que saiu a crítica do desfile da TRASHrealoficial em TRANSMUTTA; um estudo de rituais e dispositivos para transfiguração de corpas trans e travestis. O que me revoltou e logo me caiu a ficha de que estava sofrendo com uma pequeneza do mercado, as críticas de moda. De alguma forma me curou, porque também fui atingida com todo um trabalho de descaso linguístico gerado por essa plataforma. Tirando todo o trabalho transfigurativo de engraçado, insuficiente e pouco.
SEJAMOS GRATAS PELA
IMAGEM DE UMA PASTORA
TRAVESTI NEGRA COM UMA
CRIANÇA NO COLO!
APRENDAM AMAR A NOSSA
PRESENÇA, EXALTEM AS
NOSSAS POTÊNCIAS
VIVAS!(...)
Que parem por aqui, de nos tirar de engraçadas.*Bioncinha do Brasil - Costureira, Bordadeira, Escritora, Iluminadora Teatral e Técnica de Palco.