Tecnologia


Imagens, imagens, mais imagens, nós, a Inteligência Artificial E mais nós.






Grande parte dos Millennials em sua infância acreditavam que viveriam o séc XX - XXI, como no desenho dos Jetsons (1962), rodeados por robôs, e carros voando, ou vivendo sobre as consequências da evolução da inteligência artificial - A.I, como em 2001: Uma Odisseia no Espaço (1968), Blade Runner (1982), incluindo uma pitada de desdém robótico como no Futurama. Mas, para a felicidade, ou tristeza de alguns, isso não aconteceu. Ficamos com medo de nos apaixonar pela cortana, de vivermos em uma realidade paralela criada por A.I, onde cada um dos nossos dias se torne um episódio de Black Mirror. E de fato, a consciência humana pode ser descrita com tanta precisão que uma máquina pode ser feita para simulá-la?


Talvez não tenhamos a resposta para essa pergunta no agora. No entanto, cabe a nós apenas a possibilidade de compreender como o mundo será com ampliação da A.I e a sua popularização. O que já ocorre com diversas ferramentas que nos relacionamos diariamente [ok, Google].  Isso inclui,  os sistemas de Pontuação de banco, compras, redes sociais e a processos seletivos, como o caso da A.I que ao identificar perfil de mulheres nos processos seletivos automaticamente as reprovavam. E como o estado criará regulamentações, como a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, e vetará projetos que coloquem a nossa liberdade em risco. Por exemplo, o veto do Projeto de Lei 865/2019 que obrigaria o uso de câmeras de reconhecimento facial nos trens e metrôs da cidade de São Paulo. A conquista ocorreu pela junção de diversas entidades que emitiram uma nota técnica, que apontavam o risco da implementação. Acredita-se que ainda em  2023 o Brasil poderá regulamentar a utilização de Inteligência Artificial. Mas, se há essa proximidade, o medo existe, ou foi criado?  Aparentemente ninguém tem medo da Alexa, Siri e Bixby dominarem o mundo, e isso porque elas estão com você o tempo todo, e, além disso, estamos criando formas de procurar empregos no metaverso.


Manda Jobs?


Nos últimos anos a busca por esses profissionais cresceu, 671% durante a pandemia. Logo após o que restou? O aumento de juros afetou o varejo, e principalmente a tecnologia, resultando na perda de R$ 3,3 bilhões em valor de mercado com juros mais altos, e demissões massivas que afetam até no vale dos multimilionários.

As máscaras são brancas, e pele também! O  report de 2022 da Pretalab demonstra que 3% dos estudantes de engenharia da computação são mulheres negras. Já no mercado de trabalho, 30% dos profissionais do mercado de tecnologia são racializados, onde as mulheres negras correspondem apenas a 11% deste total, e com um salário abaixo de  3 mil reais.


De dentro para fora: O desespero além da tela azul do windows.



Os softwares que usamos no dia-a-dia são construídos por algoritmos, regras matemáticas estruturadas nas linhas de códigos, desenvolvido por seres humanos. “As máquinas por si só não têm viés, são seus insumos de aprendizado ou seu código que determinam como ela irá se comportar uma vez exposta no mundo aberto” é o que explica a engenheira Bianca Santos.

Os algoritmos não são neutros, Tarcízio da Silva, o autor do livro Racismo algorítimo: Inteligencia artificial e discriminação nas redes sociais, define Racismo algorítmico como  o modo pelo qual a disposição de tecnologias e imaginários sociotécnicos em um mundo moldado pela supremacia branca, realiza a ordenação algorítmica racializada. Isto é, consequência das expansões coloniais europeias que resultaram na hegemonia, e na criação de imaginários baseados na superioridade racial, forjando  a identidade estética universal, leia-se branca e europeia. Bots não idealizam outros bots, sem a dinâmica humana, e o racismo está justamente nas informações repassadas para esses sistemas, pois, elas [as pessoas] são os resultados de uma sociedade estruturalmente opressora e racista. É o que explica Camila Laranjeira, doutoranda em Ciência da Computação.


Bots, lovers e disfunção



O documentário Coded Bias, dirigido por Shalini Kantayya retrata a jornada da Dr. Joy Buolamwini onde os sistemas de análises faciais não detectam seu rosto, por ser uma mulher preta de pele retinta. Buolamwini, expandiu a pesquisa com para outros sistemas, constatou que os algoritmos possuem viés de raça, e gênero.  Quando o seu rosto era identificado, possuía maior % em ser um homem preto, ou de ser uma mulher branca. [Quanta similaridade, não é mesmo?]

Buolamwini, remonta alguns feedbacks que recebeu dos desenvolvedores dos softwares de análises faciais, onde uma delas se resumia em “será que o sistema não falhou em te detectar por você possuir muita melanina, e então ela respondeu: É, sim! Tenho muita melanina, mas as leis da física não mudaram. O que mudou foi priorizar compreender nossas diferenças para criar um sistema inclusivo”


São as novas reformulações dos  meios de vigiar e punir, [que já adiantamos por aí em: para extrapolar o frame do algoritmo] produzidos através do racismo, sexismo, transfobia, mecanizado, e automatizado em algoritmos que aprendem rapidamente a estrutura patriarcal, e hegemônica.  Logo, o racismo não é a única barreira da AI, o cistema (sistema onde o “cis” é uma norma impositiva) está consolidado na binaridade, e tráfega no marco da exclusão de diferentes expressões de gênero.

Há um discurso romântico, quando falamos sobre tecnologia, e isso faz com que compreendamos apenas as metodologias computacionais pós-modernas como válidas. Onde parte de todo o controle está restrito a um pequeno grupo de pessoas que fazem bilhões comercializando sistemas de automatização para business intelligence, reconhecimento facial para segurança estatal. Mas, não é apenas sobre o potencial da AI, mas o que se faz com quem detém os códigos, que armazenam, exploram, e lucram com ela. A Timnit Gebru, ex-funcionária do Google, alega que o desenvolvimento da AI em países do sul global  tem sido usado para centralizar o poder por aqueles que o roubaram por meio da colonização. [Basta, procurar, sobre a vida do dono do Twitter, que até dias atrás era um grande apoiador de A.I]


O Mercado do Imaginário, e bilhões




Isso nos faz entender como a representação humanos vs AI, vem se desenhando imageticamente desde os  anos  60, como vimos  acima, o medo humano de ser rapidamente substituídos por robôs. E faz sentido, porque o mesmo medo ocorreu na 1ª revolução industrial, com a criação das máquinas a vapor, mas que anulam, que, a escravidão esteve na base da Revolução Industrial. E, olha que já estamos na 4ª, pode até não fazer sentido, mas basta ver a imagem construída em Eu, Robô (2009) quando O Detetive Del Spooner, personagem vivido por  Will Smith, que se torna o único que agente com capacidades para romper os objetivos dos bots a serviço do estado.

A artista Igi Ayedun em seu trabalho Há muito venho sonhando com imagens que nunca vi produzida por A.I, reforça como a imagem sempre foi a projeção da humanidade y seus códigos de localização social entre a rota derradeira de identidades, privilégios y opressões.

Em quem é essa atriz, matutamos sobre como a Renascença europeia articulou a economia, os mercados e, logo, os valores estéticos e imaginários, transformando o olhar, em capital. A democratização da internet, possibilitou movimentos culturais, e artísticos importantes. Já a  pós-internet, a produção e a disseminação de narrativas dissidentes, em múltiplas linguagens. Pois, antes disso, a internet era um privilégio dos herdeiros. Um exemplo disso, é que desde a déc de 70 a internet é utilizada plataforma de criação Vera Frenkel artista canadense, produziu a obra String Games: Improvisations for Inter-City Video nomeada como a percursora das artes em mídias eletrônicas.  Com o  mesmo nome que o presidente do Haiti, [porém não racializado] Jean-Pierre Boyer foi um artista que não materializou em linguagens imagéticas, mas produziu uma ferramenta para a manipulação da imagem no video. Já em 1974, Norman White produz a obra Ménage, composto por quatro robôs interativos baseados no teto com um robô adjacente no chão.


Se localizarmos a intensificação da experiência virtual, também em constante atuação e influência na disputa por imagens e memórias, não seria as imagens AI um local onde também alteramos as representações? A Alteridade já ocorre em diversas linguagens e plataformas como o afrofuturismo, e a imaginação radical negra. Na capital de SP, por exemplo, muito se observa sobre na arte de rua, das periferias ao centro. Nazura, é um bom exemplo de movimentação desse interesse, já que também se atenta ao tempo em sua produção. Frequentemente associada ao Afrofuturismo, Nazura, dialoga com um grupo maior de artistas paulistanas e brasileiras num questionamento que enfatiza o ancestral como futurístico, também deslocando, assim, referências de passado e futuro, presente e agora. A inteligência artificial atua de forma semelhante neste aspecto, talvez sua particularidade esteja, exatamente, na possibilidade de manejar imagens existentes, porque reconhecemos o que vemos, em composições, arranjos e disposições muitíssimo específicas. Sem dúvida é um espaço de guerra iconográfica. Pois  se Grande parte da nossa noção de inteligência artificial vem da ficção científica, e, as ficções diferem para o povo racializado, onde tudo o que se imagina sobre o passado, e o futuro é uma projeção colonialista inventada. As fricções de querer criar ficções distópicas, satisfaz a quem? Quando parte da realidade racializada, e marginalizada, vivencia cotidianamente a distopia projetada pelo imaginário não- racializado.

Segundo Ayedun, A tecnologia desenvolveu um lugar tão expandido y híbrido em que podemos experimentar novas construções imagética a partir da nossa poética subjetiva enquanto corporeidades dissidentes, e racializadas, permitindo a invenção de mundos sem os quais não poderíamos viver, e desmanchando nos quais não vivemos por inteiro. E já enxergamos isso nas produções de artistas como a Igi Ayedun, DUDX, Suyane Ynaya, Salometrz, entre outres. Que em suas experimentações percebem as possibilidades, e as limitações raciais, e corpóreas, uma vez que os bots são alimentados com referências da branquitude.

Há futuro?  A intelectual Rutha Benjamin afirma que quando começamos a reescrever códigos ao invés de simplesmente mudar de código, podemos começar a incorporar novos valores e novas relações sociais no mundo.